Meu filho diz que se ele falasse 20% do que pensa seria pior do que a irmã. Enquanto ela vai falando o que passa pela cabeça e pensando enquanto solta as palavras pela boca, ele é do mesmo time que eu faço parte: dos que pensam mais do que dizem.
Somos um time discreto e andamos espalhados por aí, sem uniforme ou torcida organizada. Jogamos na retaguarda e, em geral, somos bons observadores. Observei outro dia quando uma conhecida criticava outra por ter interrompido quem falava numa reunião. Ué, você não se lembra de já ter feito igual? Pensei, mas não disse.
Ainda que facilite o convívio social, isso também gera a crise do “eu devia ter falado, mas não disse”. Horas depois fico ruminando uma conversa, uma situação e sou capaz de elaborar diálogos inteiros – ou seriam monólogos?! Mas por que não falei naquele momento, ora bolas?!
Não adianta. Deve ser uma espécie de delay social. Na hora sou econômica, as palavras não comparecem. Só depois é que elas chegam de vez, desfilando quando a festa já acabou, como se nem estivessem atrasadas para o compromisso. De que adianta agora?
Ah se eu dissesse tudo o que penso… Como quando vejo quem se esforça pra mostrar alguma coisa: que é inteligente, bem enturmado, tem status – nem que seja o dos outros com quem anda. Percebo, mas não digo.
Ou quando vejo aquelas declarações de amor derramadas demais, superexposições em redes sociais e círculos de amigos. Será mesmo isso tudo? Quem comeu algumas sacas de sal sem beber água que atire a primeira selfie.
Já vi alguns casos: iluminação cênica no palco pra dar aquele efeito; gambiarra na coxia. A verdade é que quem mais trabalha nos bastidores menos aparece. Pode notar. E os que mais fazem alarde nem sempre têm muito a acrescentar.
Em um curso que fiz, um colega de turma toda hora parava o professor para comentar o assunto. E ainda havia aqueles que repetiam as mesmas ideias já postas na mesa na ânsia de também opinar. A aula não avançava. Gente, dá pra parar de blábláblá e seguir em frente?! Ah eu devia ter falado!
O que seria do mundo se todos dissessem o que pensam? Algo parecido com o que já acontece nos comentários das postagens mais polêmicas. O que não falta é gente pra dar opinião só por dar, mesmo que não leve ninguém a lugar nenhum.
Ao mesmo tempo, creio que o mundo também precisa do time dos que, sem receio ou filtro, vão lá e dizem. Alguém precisa apontar que o rei está nu, quando a maioria finge ver roupas costuradas em linhas de conceitos vazios.
Sim, eu teria mais a dizer. Mas por enquanto vou ficando por aqui. Sei que depois pensarei em tudo o que poderia ter dito. Esta crônica já estará forrando o chão do apartamento da vizinha onde as cachorras fazem xixi. Ruminarei o assunto por um tempo… por que mesmo essas palavras não apareceram antes?
Eu até pensei, mas não disse.
Esta crônica que você acaba de ler está no meu livro ‘Pensei, mas não disse’… e, claro, como você acaba de notar, é justamente a que dá nome a ele. E eu adoro esse título, cá entre nós! E o texto também, pois diz um pouco de mim, essa pessoa que pensa mais do que diz… e, por isso mesmo, escreve.
E hoje é o grande dia… lanço este meu livro de estreia literária hoje aqui em Salvador, em um espaço artístico muito legal, o KreativLab do Goethe Institut. Vai ter autógrafos, bom papo e música da melhor qualidade… volto pra contar depois.
Obrigada por me acompanhar nesta Trilha de hoje… nos vemos em breve!
Abraços literários.
Ri com minha mãe na cozinha lendo essa crônica. Tô animada!
Que delícia de texto. Eu acho que estou entre os dois caminhos, mas também, talvez pense mais do que diga. Te vejo mais tarde para reler esta e conhecer as outras crônicas tão gostosas quanto :)