Do que é feita uma crônica? A pergunta veio de uma amiga, quando mencionei o meu livro de estreia (uma seleção de crônicas) que tô pra lançar. Me fez pensar. Como explicar o que eu escrevo de modo tão natural, mas que nem todo mundo tem familiaridade? Esse gênero meio misto, meio dúbio, metade pé no chão e a outra nas nuvens.
É ficção? Não é? É como um artigo? Um conto? Um ensaio? Um pouco de tudo, quem sabe… frequentemente, rola mesmo essa mistura. Ou, ainda, essa ausência de padrão único. Há quem ache que basta qualquer divagação de ideias para ter uma crônica. Há quem a veja como autoficção literária.
Nascida nas páginas de jornal, a crônica é tecida do fio do cotidiano que conduz a narrativa. Por isso já foi chamada de gênero menor. Está entre a literatura e o jornalismo. Mas como pode ser um gênero menor com expoentes com nomes grandes como Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Paulo Mendes Campos, Hilda Hilst e tantos outros?
Inspirado em uma situação, cena ou personagem real, o texto pode também fingir, exagerar, mudar um pouco as coisas de forma ou lugar. Depende da lente que a gente usa. Já escrevi crônicas a partir de uma propaganda de carro de som, de uma conversa que ouvi na escada do metrô, de uma frase impressa na embalagem do parmesão. De onde menos se espera pode sair uma crônica. E aí está a beleza.
Quando penso nisso tudo, devo confessar, nem sempre considero o que eu escrevo aqui uma crônica genuína. Pra mim, às vezes, é só um desfiar das minhas reflexões a partir de um tema qualquer. Já a crônica que eu publico em jornal, vejo um pouco diferente. Tento fazê-la mais pensada, a linguagem mais trabalhada, um pouco mais literária. Ok, nem sempre acontece assim.
Mas como nomear o que eu faço aqui, justamente onde sinto a minha escrita mais livre? A crônica já expandiu as fronteiras dos jornais faz tempo. Mergulhou na água azul da internet lá no começo dos anos 2000 e não saiu mais. Não quero ser rígida com um tipo de texto tão flexível quanto esse, que nada de braçada por tantas praias diferentes.
As newsletters de hoje são herdeiras dos blogs de antigamente. Blogs que eu adorava acompanhar, entrava pra ler texto novo daqueles autores então desconhecidos (André Takeda, Andréa Del Fuego, Tati Bernardi… até a Martha Medeiros eu conheci por lá), quando ainda não existiam as redes sociais pra divulgar. Cada um que navegasse em busca dos seus conteúdos preferidos.
Eu mesma tive um blog. Ainda não era crônica. Eram textos curtos, tentativas literárias, só um jeito de me expressar. Não durou muito. Bem que eu podia ter levado adiante, mas me faltava a consistência. Eu ainda nem imaginava que me tornaria cronista um dia. Mas é natural que a gente acabe escrevendo aquilo que gosta de ler.
Hoje o meu blog é aqui. E, aqui, junto com as crônicas que publico em jornal, escrevo sobre a vida, o correr dos dias, o que vejo, o que penso, o que me rodeia. Transformo em palavras o que me toca, me interessa, me incomoda, me desperta.
Do que é feita uma crônica, afinal? É feita de quem a escreve, acabo de descobrir.
Obrigada por me acompanhar até aqui, nesta Trilha de hoje.
E se você também gosta de ler crônicas, pode me contar do que você mais gosta nesse gênero literário?
Sobre o meu livro, aguarde! Em breve, vou divulgar o lançamento e a pré-venda pela editora Patuá, ok.
Obrigada e até a próxima edição.
Abraços literários,
Luisa Sá Lasserre
Amei a forma com você descortinou a crônica, por muitas vezes pensei numa forma de elucidar a crônica para algumas pessoas e você foi magistral.
Obrigado pelo texto.
Eu já amei essa notícia do livro! E já estou ansiosa aqui. :-)